segunda-feira, setembro 28, 2009

Um tributo delinqüente: 19 anos Balanço do Rock


Dezenove anos atrás surgia o programa de rádio mais importante para a história do rock no norte do país. Deste país, digo. Em 1990, o Balanço do Rock foi concebido para ser uma série de 12 programas especiais sobre as décadas 50, 60, 70 e 80. Acabou que o programa seguiu e extrapolou o projeto inicial, perdurando desde então até hoje.


Tudo o que é rock - e também muito do que não é necessariamente - passou pelas mãos do há muito tempo apresentador Beto Fares, figura emblemática e em quem repousa, tenho certeza, a confiança e o respeito de todos os atores desta cena roqueira. Produtor de mão cheia e profundo conhecedor de música, e não só de rock, Beto, ao lado da doce produtora Regina "Regi" Silva, dos mais antigos que sempre aparecem nas tardes de sábado na FM da Rádio Cultura, como Teco Trovão e Felipão "Pedro&Bino" Gillet, ou dos mais novos que sempre mantém o sangue novo correndo nas veias do programa, como Camillo Royale e Raquel Serruya, programa o espelho que reflete a real imagem do rock paraense.


E para comemorar o aniversário, às vésperas de completar duas décadas, a produção do BdoR organiza um tributo à banda Delinqüentes, dividindo os seus maiores clássicos entre 10 bandas de estilos diversos.


Sábado, 26 de setembro, foi o dia da audição das versões de cada banda. Imagina: 10 bandas reunidas em um estúdio de rádio, ouvindo juntos e comentando sobre o resultado, tudo ao vivo, no ar. Só podia ser no BdoR. Uma festa muito bonita, sem bolo, reclamamos, mas tudo bem.


Tirando um ou outro chilique, o programa comemorativo de 19 anos do BdoR foi muito divertido. Impressionante mesmo foi o fato de que todas as bandas puseram à prova o excesso de talento que há dentro de si, já que no pouquíssimo tempo de 4 horas de estúdio, realizaram grandes releituras de clássicos do hardcore (diria nacional, sem dúvidas), em versões impensáveis, como na suave e doce voz de Ana Clara cantando Utopia Milenar, transformando os bardos de Jayme Katarro em poesia. Digo, evidenciando a poesia que já há no Delinquentes, acompanhada por uma onda mpbista quase sensual, de tão preguiçosa, não num sentido ruim, mas de um jeito quase de se espreguiçar, numa rede, num ventinho. Gostei mesmo dos delays, efeitos e do midi de guitarra criados por Ulysses Moreira, técnico responsável pela mix e pelas gravações de todas as faixas.


Além desta versão, a do Pro.efx & Bruno B.O., com Delinquente, num eletro-hip hop muito doido, e do Massa Grossa (Pio Lobato, Iva Rothe e cia.) me chamaram muito atenção. Não à toa sou super fã do Pio. O modo como o Massa Grossa deixa L'uomo Delinquente tensa, tão tensa, numa mistura de guitarrada com "carimbó doom" é impressionante. É uma elegância quase arrogante nos arranjos, de quem tem a certeza em fazer a melhor versão do disco todo. Pelo menos é a que me tomou de assalto e, no susto, me deixou besta. Eu gasto muito tempo e algum dinheiro tentando achar timbres muito bons pras minhas guitarras, enquanto Pio Lobato só pluga a dele em linha, direto na mesa, e faz como mágica. Incrível.

Outra que merece ser comentada é a versão do Suzana Flag, com Planeta dos Macacos. Joel é, sem dúvidas, o senhor dos arranjos pop de todo o norte do hemisfério sul, e digo isso sem medo de errar. Impressiona a qualidade da produção dos vocais, da melodia e harmonia na releitura do SF, transformando um mega hit HC muito do seu porrada em uma manhã ensolarada de domingo na Praça da República, com família e sorvete lambregado na ponta do nariz. Na parte em que Suzane canta na sua eterna voz de menina "Camburões sufocantes, celas gélidas /Tortura de inocentes por gambés incompetentes" ,eu quase grito " me prende, me prende". Muito foda.

Turbo, tocando O Viciado, mostrou um elaboradíssimo arranjo, com violões, várias camadas de guitarra, um baixo retão, muito másculo, dos antigões anos 70 da Giannini, e um coro gritando no refrão "Não acredito, em portas abertas com mãos amarradas /Não acredito, em braços furados com mãos doloridas /Não acredito, em doces viagens de lombra errada"Pareciam mil pessoas, mas nem eram. Do mesmo modo que a versão do Sincera soava de maneira jazzista, com um trompete muito do seu malandro, cabendo certinho no tema de Vaga Mundo, marcado pelo vocal ora manso, ora gritado de seu vocalista performático, Daniel. Sob a batuta de João, que participou em diversas outras faixas como batera, guitarra, violão, vocal, o Sincera fez uma das versões mais elogiadas, pela ousadia dos jovens garotos que parecem pipoca em panela quente nestes últimos meses.

Por fim, tive a oportunidade de participar com o Aeroplano da canção Um belo dia pra morrer. Eric, o líder da banda, alto e que todas as meninas querem, desfez a versão original, ultra agressiva e destruidora, reconstruindo-a em acordes abertos e com uma harmonia vocal mais melodiosa, abusando de guitarras single coil, que para uns remete logo a Sonic Youth, enquanto que para outros é mais Radiohead. Nicolau, figura folclórica e de destaque político neste meio independente amazônida, preferiu dizer que esta versão lembrava muito uma banda dos anos 80, cujo nome não me recordo. Ele frisou que era um elogio. Jayme sentiu medo da releitura, mas eu juro que a principal mensagem que a música trouxe a mim foi " hoje está um belo dia pra morrer", significando que poderia acontecer qualquer coisa, que estaria tudo bem.

De tudo, acho que há uma característica comum em todas as versões feitas pelas 10 bandas que participaram do tributo ao Deliquentes, comemorando os 19 anos do Balanço do Rock: a força das letras desta banda. Ignorante e analfabeto cultural que sou, nunca reparei muito nas letras de bandas de HC. Confesso que não é a minha praia, e muito provavelmente nunca será. Fiquei impressionado com o alto grau de expressividade e a escolha certeira das palavras na hora de transformar o discurso social e a revolta em canção. Pra quem não teve a oportunidade de ler algumas das letras, aí vai o link: http://letras.terra.com.br/delinquentes/

Segue a lista das músicas e seus respectivos re-criadores:


1. Suzana Flag - Planeta dos Macacos
2. Pro.efX - Delinquentes
3. DHD - Gueto
4. Turbo - O Viciado
5. Sincera - Vaga Mundo
6. Massa Grossa - L'uomo Delinquentes
7. Aeroplano - Um Belo Dia pra Morrer
8. Coisa de Ninguém - Cicatrizes de Guerra
9. ION - Fábrica
10. Ana Clara - Utopia Milenar



Em breve, disponibilizo o áudio de todas, assim que a permissão me for dada. Parabéns Beto Fares, parabéns Delinquentes, parabéns bandas que fizeram a parada, e parabéns ao Balanço do Rock. E vida longa ao maior programa de rock do estado.


3 comentários:

  1. Parabéns pro programa, e to curioso pra escutar as versões, tenho certeza que estão fodation!

    Abraço vizinho...

    Milton

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  2. Muito bom o resumo do que foi o resultado dessa força tarefa idealizada pelo grande Beto fares. Há de se ressaltar: No aniversário do Balanço: Todos fomos presenteados. Não só a Delinquentes, por ter sido a banda escolhida para ser homenageada de forma homérica, mas de todas as bandas e artistas envolvidos, por tarem criando um verdadeiro laço de união na nossa cena.

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  3. Com esse post, dá pra ter uma idéia muito ampla da intensidade como esse trabalho todo rolou, muito bom. E pelo amor de Deus, os áudios!!! eheh
    Parabéns ao Balanço, ao Delinquentes e claro todas as bandas que participaram da homenagem.

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