Mostrando postagens com marcador Eletrola. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Eletrola. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, novembro 11, 2009

O enterro digno do Eletrola.

Não sou ninguém pra dizer isso, mas, se dividirmos a história do rock paraense, teremos a velha, de 2000 pra trás e a nova, de 2002 pra frente. A primeira abarca todas as bandas oitentistas que acabaram ganhando um status respeitoso - acho que tem a ver com respeitar os mais velhos, não sei - e de quase intocáveis. Tanto que algumas ainda hoje teimam em não dar um último suspiro, ao lado das que se renovam sempre e com muita qualidade - Delinquentes, por exemplo. Gosto de incluir neste grupo as que pertencem ao final da década de 90 e mordiscam o início do século XXI, como Caustic, Stigma, Step 2, Berkana, No Exit (antes de ser Avens) e outras, que traduziam muito bem o que era o underground, com a maioria tocando no idioma inglês, numa cena que mais parecia um Big Brother Belém.

Por que eu chamo isso de parte velha da história do rock paraense? Porque, a partir de 2002, as coisas começaram a mudar. Uma banda e um produtor foram capazes de reformular todo o conceito de show, de festa, de rock, de underground, de roupa, de instrumentos, de diversão, de cena, de noite, de divulgação, enfim, de tudo, absolutamente tudo que trata de tocar em uma banda autoral em Belém.


O Eletrola era formado por Eliezer Andrade, com todo o seu talento hitmaker que já mostrava futuro, além do carisma quase calculista, no vocal e guitarra; Camillo Royale, o eterno guitar hero de Belém, o cara que quebrava amps e instrumentos, enlouquecia no palco, na guitarra; Natanael Andrade, até então apenas irmão do vocalista, no contrabaixo; e Andrea, a garota que devia receber mais cantadas por noite de show de toda a região norte - até eu dei as minhas, confesso, na bateria. Pra quem não viveu aqueles tempos, não faz idéia de como o Eletrola participou da vida de todos os jovens que se ligavam em música independente ( ninguém nem se chamava de independente), seja público, seja integrante de outra banda, não havia quem não comentasse sobre o Eletrola, gostando ou odiando.

Num efeito concomitante, que muito me parece que foi o destino quem nos proporcionou, o Suzana Flag e o Stereoscope, lançaram cada um seus incríveis discos "Fanzine" e  "Rádio 2000", debutando para o mundo para logo cair nas graças do público paraense e chamar atenção de produtores de fora ( o gordo Miranda e uma ruma de gente, pelo SF; Fernando Rosa, pelo Stereo).

A FUNTELPA, via Tv e Rádio Cultura (esta, sob a batuta do grande Beto Fares), à época do visionário e competentíssimo Ney Messias Jr., abanou o carvão do rock paraense de um jeito que bate uma tristeza e uma saudade, só de lembrar. Todo sábado de manhã, no extinto Cultura in Concert, Ney Messias comandava o horário da música feita no Pará e quase sempre tinha banda de rock. Foi uma época em que se criaram e proliferaram os "Café" alguma coisa da vida, como o Café com Arte, Café Taverna, Café Pará, e foi por nessa onda que surgiu a (ainda DançumSe Rasgum. Sem contar a extinta Lithium e o Expresso da Meia Noite, além dos bares da Cidade Nova, com o Eclipse, Pará-o-Bar e outros que esqueci o nome.

Voltando ao Eletrola.

Não dá pra falar da banda e do movimento que reformulou, meio sem querer, por sinal,  o modus operandi de cada banda que viria depois dessa época, sem falar em Alex Queiroz, ou Alex Zamba. Ou Corujinha, o produtor executivo, sobre o qual recaem diversas acusações e lendas, mas não vem ao caso falar sobre isso.


Alex veio não sei de onde e com uma visão impressionante salpicou os primeiros lampejos do que seria produção estética, visual e conceitual em uma banda de Belém. Adeus fotos de divulgação ridículas, adeus bandas que dizem "ah, não sei qual o nosso estilo". Adeus blusas sem estilo, tênis reebok e bermuda!


Com Alex, o Eletrola deixara de ser uma simples banda de rock que tocava "ah, não sei, é uma mistura de foo fighters com... weezer... com... " pra ser Rock 'n Roll Tutti Frutti, seja lá o que for isso. Mas funcionou. A banda gravou um CD na sala da casa de um amigo, desafiando todas as regras da falta de dinheiro. O pior é que o disco ficou legal e ainda é um dos favoritos de muita gente até hoje, além de ter sido escolhido como um dos 50 discos independentes mais importantes da história. Eles trouxeram o Autoramas e MQN pela primeira vez a Belém. E O Eletrola tinha um clipe passando na MTv! Tenho pena de quem nunca cantou "Meu amor, uh uh uh...".





Depois do clipe e do disco, a banda rodou metade do país, varando pelo Goiânia Noise, e passando por São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná, sei lá mais por onde, ao lado de bandas como Cachorro Grande (foto), contabilizando mais de 40 dias fora desta capital paraense, acompanhados do, até então quase anônimo, Renato Reis, que ali dava os primeiros passos para ser um dos mais renomados fotógrafo do meio independente do país, ou coisa do tipo.

Ocorre que, devido ao desgaste brutal da turnê, que só fez acentuar diferenças pessoais e as dificuldades de se sustentar uma banda sem toda a estrutura que se precisa, digo, ainda mais quando se é novo, como eles eram, tem uma hora que tudo vai pro saco. Ao voltarem a Belém, foi inevitável o término da banda. Pegou os paraenses de surpresa.

Do fim do Eletrola, quase de bate-pronto veio o Johny Rockstar, com os irmãos Andrade. Um ano depois, o Turbo, com Camillo.Bandas que até demoraram pra engrenar, mas que hoje se desvincularam completamente da sua antecessora e hoje são duas das cinco mais importantes bandas de Belém e estão entre as 10 mais interessantes de rock do norte, com certeza.

Arrisco-me a dizer que o Eletrola foi o elemento aglutinador e responsável pelo que temos hoje. Claro que não foi só a banda quem deu origem à atual conjuntura da cena local, mas, de um modo ou de outro, foi uma das principais responsáveis por unir as mãos de todos que estão atuando ainda hoje. Quando a banda se foi, para todos nós parecia que se tinha ido um parente. Foi triste, meio desolador. Mas... lembrando agora tudo o que se passou naquela época, parece até meio mágico. Belém era quase Seattle de Kurt, era quase Recife de Chico Science, era quase Liverpool de Lennon, Paul, Ringo e Harrisson.

Ia terminar o texto neste parágrafo de cima, mas quero evitar a má impressão terrível do quase. Tem gente que chora à míngua reclamando de Belém ser a eterna quase-city, mas prefiro entender que nada se perdeu, como se precisássemos começar tudo de novo. O trabalho continua, e hoje é tão mais bonito, em diversas frentes de batalha, seja com a Se Rasgum, seja com a Pro Rock, seja com o Coletivo Megafônica/ Circuito Fora do Eixo, seja com a Associação Paraense de Rock, seja sozinho, nós estamos nisto porque isto está em nós, rockstar fajutas que somos, deste mundo paralelo que é o meio independente. É a nossa vida.

Valeu, Eletrola, por mudar a minha vida e a história da minha cidade!

Vamos ao enterro digno do Eletrola, no dia 13, sexta, às 23 horas no Palco Laboratório no Festival Se Rasgum. BAIXE o CD no Blog do Azul, o Música Paraense, e cante todas no show!